Cultura

Palácio das Laranjeiras:
O recanto da aristocracia carioca

Muito mais do que a residência oficial dos governadores do Estado do Rio de Janeiro, o exuberante Palácio das Laranjeiras é símbolo de história, arquitetura e política. Edificação inspirada no estilo europeu, com forte influência na decoração francesa, incluindo objetos de arte similares aos da realeza do Palácio de Versalhes e ambientes que remetem à época dos reis “Luíses”.

Essa joia do povo fluminense, de grande relevância para o patrimônio histórico-cultural, teve uma construção arrojada, erguida entre os anos 1909 e 1914. O imóvel emblemático está localizado na parte alta do tradicional bairro de Laranjeiras, Zona Sul do Rio. Já hospedou delegações estrangeiras em visita ao Brasil, foi sede do governo do Distrito Federal e residência oficial do presidente do Brasil. A partir de 1960 passou a ser o local de despacho dos governadores do estado. O Palácio das Laranjeiras foi pioneiro na concepção moderna da divisão de espaços para moradia, em alas íntima, social e de serviço.

Palácio símbolo de uma época em que a França era modelo arquitetônico. Segundo estimativas, as obras teriam custado cerca de 1 milhão de dólares – o equivalente hoje a 24 milhões de dólares. Já serviu de residência para os presidentes Dutra, Juscelino Kubitschek e João Goulart.

Eduardo Palassin Guinle (Porto alegre, 1846 – rio de Janeiro, 1912) foi o patriarca dos Guinle, uma das famílias mais ricas do Brasil entre o império e os governos militares. casou-se, em Porto alegre, com Guilhermina Coutinho da Silva (1854 – 1925), filha do hispano-uruguaio sebastião coutinho da silva e da brasileira escendente de italiano Francesca tubino.

Era início do século XX, a família Guinle, uma das mais abastadas e poderosas da capital da República, colecionava propriedades e era dona de uma firma de importação de maquinário industrial e até mesmo da Companhia Brasileira de Energia Elétrica. Eduardo Guinle, um jovem engenheiro civil, idealizou o palácio para receber a elite em alto estilo em um platô da encosta, emoldurado pelo verde da Mata Atlântica, com uma bela vista para a Baía de Guanabara e o Pão de Açúcar. Sua construção acabou se tornando mais um cartão postal da cidade. Ao todo, a terra adquirida por Eduardo na região chegou ao total de aproximadamente 430 mil metros quadrados, abrangendo o atual Parque Guinle, porém hoje a área da propriedade é mais restrita.

Para a decoração, Eduardo também não poupou recursos e buscou em Paris nomes afamados que contribuíram com uma ornamentação de alto valor artístico.

VALOR ARTÍSTICO

O projeto do palácio foi assinado pelo arquiteto construtor Armando Carlos da Silva Telles, provavelmente baseado em um desenho inicial do arquiteto francês Joseph Gire, que posteriormente projetou para outros membros da família o Copacabana Palace Hotel e o palacete da Ilha de Brocoió.

o grande vitral da escadaria, fabricado em 1910, em Paris, remete ao deus do sol da mitologia clássica “apolo e seu carro de sol

Para a decoração, Eduardo buscou em Paris nomes afamados para participarem da ornamentação de alto valor artístico e, para isso, também não poupou recursos. Contra tou a firma francesa Casa Bettenfeld, que, para atender à tamanha demanda, acabou instalando uma filial no Rio de Janeiro. O material utilizado foi escolhido a dedo: boi-series (painéis decorativos que revestem as paredes) de madeiras nobres, colunas maciças de mármores italianos, porcelanas Wedgwood, delicados parquets belgas, além de móveis inspirados na realeza francesa, como a cópia fiel do “Bureau du Roi”, a escrivaninha do Rei Luís XV e o piano em homenagem à rainha Maria Antonieta.

A TRANSFERÊNCIA PARA O GOVERNO FEDERAL

Ao término das obras, em meados de 1913, a família Guinle mudou-se para a luxuosa residência, onde viveram por quase três décadas. Apesar de tanto investimento para erguer um palácio digno de realeza, a maioria dos Guinle não gostava de eventos sociais. Com a morte de Eduardo, em 1941, aos 63 anos, sua esposa Branca e os filhos decidiram vender e lotear a extensa propriedade.

Em 1946, durante a gestão do general Eurico Gaspar Dutra, o palacete e seu acervo de móveis e objetos artísticos foram adquiridos pela União por 27,5 milhões de cruzeiros acrescidos de terrenos da Esplanada do Castelo. A mansão ficou à disposição do Ministério das Relações Exteriores para hospedar visitantes oficiais na então capital do país. E, no governo de Juscelino Kubistchek, o Palácio das Laranjeiras passou a ser a residência oficial do presidente da República.

Presidente Juscelino Kubistchek recebendo o cantor norte- americano Nat King Cole, na sala de Música do Palácio, 1959

Além da presença constante de políticos e de autoridades internacionais, os salões do Palácio das Laranjeiras receberam diversas personalidades do mundo artístico, como a atriz Marlene Dietrich, o cantor Nat King Cole e o músico Louis Armstrong.

Decisões importantes sobre a construção de Brasília foram tomadas neste palácio, onde Juscelino, de seu gabinete, em 19 de abril de 1960, leu o discurso oficial de despedida do Rio, dois dias antes da inauguração da nova capital federal do país.

PATRIMÔNIO TOMBADO

Com o passar dos anos, foram necessárias obras de restauração e, assim então, em 1979, o Palácio das Laranjeiras consagrou-se como bem tombado pelo Instituto Estadual do Patrimônio Cultural – INEPAC e, quatro anos depois, pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN. Até hoje, uma equipe de restauro, coordenada pela museóloga Luiza Rache, trabalha na recuperação e conservação das peças. “Veja como esse palácio brilha! No piso, nas boiseries, no mobiliário, em todos os detalhes do salão há folhas de ouro. O assoalho da sala de música é um parquet belga. A base da parede da sala de visitas é toda em carvalho, um luxo!”, encanta-se Luiza ao apresentar a ala social composta por oito ambientes.

É a partir do hall que se dá a distribuição das salas, cada qual com uma função específica. No primeiro pavimento estão os ambientes de receber: a sala de visitas, denominada Salão Luís XIV, a sala de jantar, o fumoir (sala de fumantes) e a sala de música. Já no segundo, estão a biblioteca, a sala de bilhar, denominada Salão Império e a ala de quadros, batizada de Galeria Regência.

O ambiente social no segundo pavimento
Escultura em mármore carrara ao estilo grego clássico

No primeiro pavimento estão os ambientes de receber: a sala de visitas, denominada Salão Luís XIV, a sala de jantar, o fumoir (sala de fumantes) e a sala de música.

O salão de jantar com 100 m²

Em 1974, o general Ernesto Geisel optou pela desativação das funções do Executivo Federal no Palácio das Laranjeiras. O antigo palacete, que desde 1956 estava disponível como residência oficial dos presidentes do Brasil, foi cedido ao novo Estado do Rio de Janeiro, criado a partir da integração do Estado da Guanabara ao território fluminense. Foram elaboradas, então, mudanças administrativas com adaptações necessárias para a acomodação dos novos moradores, preservando o patrimônio histórico.

A área museológica é separada internamente dos aposentos reservados à família do governador. Alguns optam por residir lá, outros utilizam o palácio apenas para despachar, fazer reuniões e eventos. A casa dos governantes fluminenses continua movimentada, a serviço da política com inestimável valor histórico-patrimonial.

O lavatório duplo da suíte esculpido em mármore.
Quarto Luis XV ou Quarto do casal. Duas camas com acabamento em marchetaria e ornatos em bronze.

PALCO DE IMPORTANTES DECISÕES POLÍTICAS

O Palácio serviu de cenário para fatos que marcaram a história política do Brasil, assim como manteve o seu papel tradicional de espaço de convivência e interação social.

1964 – No jardim do Palácio das Laranjeiras, o então presidente Jango anunciou em solenidade a assinatura do decreto que elevou os níveis regionais do salário mínimo em todo o país.

1968 – O Palácio das Laranjeiras tornou-se novamente lugar da edição de mais um Ato Institucional, o AI-5.

1969 – Local da cerimônia de lançamento da Emenda Constitucional nº 1.